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quinta-feira, 4 de junho de 2009

ANTI-HERÓI AMERICANO (2003)

Às vezes uma grande obra pode surgir de algo aparentemente despretensioso e desinteressante. Esse é o caso do filme “American Esplendor”, chamado no Brasil de “Anti-herói Americano”.


Essa foi uma das produções cinematográficas que foram exibidas ano passado no Cineclube Quadrinhos S.A., como parte do ciclo “Das Páginas Às Telas”, e por eu ser parte da organização da referida ação cineclubística, acabei assistindo o que pra minha surpresa se tornou o número 1 da minha lista de adaptações de quadrinhos pro cinema.
A história é a seguinte: o arquivista de um hospital, Harvey Pekar, após conhecer um futuro grande artista das HQs independentes chamado Robert Crumb (autor de “Fritz, The Cat”), decide escrever roteiros para quadrinhos inspirados em suas desventuras peculiares, tanto no emprego quanto na sua conturbada relação com amigos e com sua esposa. O retrato que ele faz é tão simples quanto envolvente, e torna-se impossível não se identificar com o cara que faz críticas de discos de jazz nas horas vagas, e trabalha num arquivo.


Pra falar a verdade, só essa combinação inusitada de “história de um profissional de arquivos, que escreve roteiros de HQs underground” é por si só motivo suficiente pra assistir o longa-metragem, mas eu não recomendo assisti-lo apenas por isso.
A base para o roteiro está nas HQs “American Splendor” e em “Our Year With Cancer” (esta última escrita em parceria com a esposa do protagonista, interpretada por Hope Davis), resultando em algo que poderia ser definido como um “ficcio-drama”.
No entanto, a narrativa não fica apenas na mera transposição desse material para outro formato. Consegue ir mais longe, mostrando o verdadeiro Harvey em cena, e levando o real a se confundir com o personagem, questionando inclusive sua própria existência. Seria o autor dos roteiros na verdade uma versão bidimensional de si mesmo, desenhado nas páginas das revistas escritas por outra pessoa? Falando assim pode até parecer muito complicado, porém assistindo o resultado do trabalho dos diretores Robert Pulcini e Shari Springer Berman, fica claro até demais.


Outro fator determinante para o êxito da adaptação é o ótimo elenco, em especial a atuação inspiradíssima de Paul Giamati, capaz de ser Harvey Pekar, mesmo que o Harvey “original” esteja também presente interpretando a si mesmo.
Aliás, obviamente não foram à toa os prêmios no Festival de Cannes e no Oscar.
A vida rotineira é complexa, afirma Harvey, e talvez pareça que a vida dele é realmente mais estranha e excêntrica que a do resto de nós, mas será mesmo?


A diferença da realidade retratada na tela em relação à nossa está no modo como ele consegue ver o próprio dia-a-dia, atribuindo valor e um humor ácido e peculiar ao que há de frustrante em seu cotidiano.
Na verdade, a vida de todo mundo poderia virar um bom roteiro.
E mesmo que nem todos nós sejamos arquivistas, ou artistas de quadrinhos, e nossas existências diárias não virem roteiro de cinema, uma coisa temos que admitir: com certeza, somos todos anti-heróis.



Quanto vale:


Anti-Herói Americano
(American Splendor)
Direção: Robert Pulcini e Shari Springer Berman
Duração: 101 minutos
Ano de produção: 2003
Gênero: Drama




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