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quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

TOY STORY 3 (2010)



Houve um determinado momento em que a revolucionária animação CG virou algo estritamente banal.
Já não aparentava existir nenhum novo grande avanço, afinal a técnica obviamente se aprimorava, alguns roteiros legais surgiam, e muitos ruins também.
Enquanto isso, a Pixar reinava soberana, costumeiramente com bons trabalhos, e faturando fortunas não apenas em bilheterias, mas também em produtos licenciados.
Porém, era um contexto em que apesar da alta qualidade atingida, parecia existir um nível insuperável, uma estagnação no ponto máximo de apuro técnico possível de ser alcançado.

Ao retomar a trama do filme que inaugurou essas novas possibilidades cinematográficas o que poderia ser feito para que isso não se tratasse de apenas mais um filme, que não fosse apenas bem sucedido comercialmente, mas também digno da importância da franquia à qual estaria dando continuidade?
Obviamente que sendo uma obra com o selo de qualidade da Pixar o roteiro deveria ter algum questionamento humano norteando o enredo.
E nesse terceiro ato o tal questionamento é especialmente um resultado da evolução e construção da personalidade do seu protagonista.
O cowboy Woody sempre foi o pilar emocional da exótica família de plástico e movida a pilhas, baterias, etc, que habitava o quarto do garoto Andy. Eram as suas certezas que na maioria das vezes eram desconstruídas, e o seu aprendizado era frequentemente o que o público guardava ao fim da sessão.

Sua estruturação de herói exemplar sempre esteve no limite de uma fé incondicional, que diante da adversidade era destruída e fortalecida quando redescobria as razões de sua confiança.
Além disso, os roteiristas não ignoraram um detalhe imprescindível nesse novo episódio: o público que acompanhou os filmes desde o lançamento do primeiro Toy Story, cresceu.
A história respeita isso, e faz questão de inserir maturidade na forma de contar o que poderia muito bem ser o desfecho da franquia.

Afinal, esse filme é um rito de passagem para todos os personagens, humanos ou brinquedos, e também para a plateia.


Impossível não reconhecer a absoluta humanidade no que alimenta a busca dos brinquedos por aceitação, de encontrar em seus donos a devoção que eles constantemente lhes dedicaram.
Ao desenvolver essa ideia, dessa vez o panorama torna-se bem mais sombrio, com ares trágicos, e inteligentemente o roteiro revisita o subgênero dos filmes de prisão. Sem a caricatura ou a violência, mas com sua forma e potencial intensidade exploradas com maestria.
A edição e o visual deslumbrante são os aliados do diretor Lee Unkrich, que demonstra que basta relatar uma história com integridade e criatividade para obter um grande filme, afinal, as relações humanas já possuem doses suficientes de humor e ironia naturalmente.


Não se engane achando que esse é somente um filme infantil, meramente pelo fato de que os seres humanos são apenas coadjuvantes, ou na maioria das vezes figurantes.
Talvez não pareça, mas ainda que os brinquedos que protagonizam o filme não possam crescer, os adultos na plateia podem ver neles o reflexo do seu amadurecimento, e dos valores primordiais que deixamos pelo caminho à medida que nos consideramos velhos demais para enxergar valor nas coisas simples.

A Pixar novamente estabelece um novo patamar de qualidade e um de seus melhores filmes.
Porém, agora fica a questão: será que Toy Story 3 tem chance no Oscar?

Quanto vale: 2 ingressos.

Toy Story 3
(Toy Story 3)
Direção: Lee Unkrich
Duração: 103 minutos
Ano de Produção: 2010
Gênero: Drama/Comédia/Aventura

domingo, 26 de dezembro de 2010

(500) DIAS COM ELA



O subgênero das comédias românticas está decadente.
E eu digo isto não devido a alguma crença ou filosofia particular de minha parte.
Trata-se de uma constatação fundamentada pela enfadonha superficialidade dos roteiros que tornou toda uma leva de filmes apenas cópias uns dos outros.
O público simplesmente conformou-se e passou a investir seu tempo para assistir as mesmas ideias e fórmulas prontas, desde o início até a reviravolta de sempre no final, ou seja: depois de tudo, eles vão se separar, mas um deles descobre que não pode viver sem o outro, e então corre até o aeroporto, ou local similar que representa a distância intransponível entre os dois. E no último instante, eles ficam juntos.
Ser previsível agora é vendável, e diante disso, pra que inventar algo novo?

Com uma carreira bem-sucedida dirigindo videoclipes, Marc Webb realizou este primeiro longa-metragem sem provocar grande expectativa.
Recentemente, com o anúncio de que seria o novo diretor da franquia do "Spiderman", tornou-se o assunto do momento, tanto para críticas prévias ao seu trabalho ainda não filmado, quanto para despertar a curiosidade quanto ao que ele poderia fazer no reinício (ou continuação) das histórias do personagem na telona.
Mas para ter alguma ideia do trabalho dele, “(500) Dias com ela” é o principal referencial disponível.
E sim, o filme é uma legítima comédia romântica.

Recortado e distribuído semelhante a um quebra-cabeças, o pequeno conto de fadas moderno narra a história do tragicômico romance entre Tom e Summer.
Personagens típicos, comuns desse tipo de filme, as diferenças entre eles, meio “Eduardo e Mônica”, só representam a certeza de que foram feitos um para o outro. Certo?
Não necessariamente.

A plateia ainda não sabe, porém o que virá a seguir é uma demonstração da incapacidade humana de enxergar as coisas sob outra perspectiva, quando observar apenas os detalhes positivos é muito mais legal e confortável.
Enquanto o protagonista percorre aleatoriamente os 500 dias de seu desafortunado, apesar de inicialmente promissor envolvimento amoroso com seu interesse romântico, o próprio cineasta busca encontrar as razões pelas quais a situação do casal fugiu do controle.

Para isso, investe nas mais variadas formas de linguagem, fundindo referências com cuidado e os maneirismos aprendidos com a indústria de videoclipes. A edição, as escolhas estéticas às vezes com um ar quadrinhesco, mudanças de pontos de vista, ou mesmo a apresentação de mais de um ponto de vista simultaneamente buscam justamente isso.
Além disso, “(500) Dias Com Ela” é um exemplo de escolha perfeita de trilha sonora no cinema, levando-o a dialogar com os musicais cinematográficos. As músicas interagem com o espectador com extrema naturalidade, complementando o roteiro do filme e tornando cada eventual passagem de tempo um momento a mais para inserir dramaticidade no filme.
Marc Webb obviamente optou por resgatar um pouco da arte antigamente parte desse filão cinematográfico, quando contar o tal romance não era o bastante e havia a necessidade de proporcionar o envolvimento com o episódio que preenchia o tempo de metragem.  


Desse modo, o diretor não necessariamente está criando algo novo, e sim relendo suas influências, modernizando-as, e desconstruindo, com um exagero de estilo e boas ideias, o padrão com que Hollywood se acostumou.

Somente assim para que a mulher que desgraçou a vida do arquiteto de nome Tom não assuma a função de vilã do longa-metragem. As diferenças entre eles, os princípios pré-definidos antes mesmos de se conhecerem e que catalisam a tragédia anunciada são tão bem construídos que a nada romântica Summer permanece apaixonante em sua pragmática forma de esfacelar esperanças alheias.
A personagem de Zoey Deschannel, que novamente põe em prática seu talento natural de roubar a cena, é um retrato pessimista de uma geração, enquanto que o personagem interpretado por Joseph Gordon-Levitt aproxima-se do outro extremo.
O olhar de Marc Webb acerca dos relacionamentos humanos não permite que haja inimigos ou arqui-rivais. A humanidade que ele expressa em seus protagonistas não pode se restringir à obsessão quase caricatural dos filmes “água com açúcar”.


E sendo assim, ao final da história nem adianta se esforçar para compreender os momentos ou motivos que significaram os pontos de ruptura no relacionamento de Tom e Summer. Não há uma ciência no desenrolar do enredo que impeça que algo similar ocorra novamente e a aceitação desse fato é a lição valiosa que o quebra-cabeça montado permite vislumbrar.
Esqueça as comédias românticas genéricas que brigam por espaço nos cinemas.
(500) Dias Com Ela” assimilou inteligência e intensidade ao seu resultado final, redefinindo o subgênero até então estagnado do qual faz parte, e tornando-se talvez o único desses filmes recentes que vale a pena assistir.


Quanto vale: um ingresso e meio.


(500) Dias Com Ela
(500 Days With Summer)
Direção: Marc Webb
Duração: 95 minutos
Ano de produção: 2009
Gênero: Romance/Drama/Comédia

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

KEEP DRAWING - Pincher, The Killer


E continuando com os esboços e ilustras que serão postadas aqui no blog, a dessa semana é o retrato fiel do ser canino do gênero feminino que defende a propriedade alugada na qual habito.
Novamente a grafite por mera questão de estilo, e porque é concluído mais rápido.

Confiram abaixo.



E até o fim de semana, nova crítica de cinema.
Aguardemos.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

PRÍNCIPE DA PÉRSIA: AS AREIAS DO TEMPO (2010)

É uma maldição conhecida.
Por motivos que ninguém consegue explicar, os games possuem uma severa dificuldade em migrar para o cinema.
Não importa se eles já absorveram a linguagem cinematográfica em seus enredos, ou quanto seja investido para que os filmes sejam produzidos. São realmente muito raras as adaptações que sejam bem recebidas pelo público e crítica. 
Na verdade, eu só consigo lembrar de duas que valham a pena ser assistidas: “Terror em Silent Hill” (2006), e “Final Fantasy VII: Advent Children” (2005). Especialmente este último.
E com certeza não faltou investimento.
Elencos famosos, efeitos especiais, e ainda assim nada funcionou.

Mas ao menos a franquia Resident Evil provou que é possível arrecadar um bom dinheiro em bilheterias mesmo não apresentando um produto minimamente aceitável.
Sendo assim, a adaptação de um game clássico e cheio de ação tende a ser no mínimo um modo prático de lucrar bastante, e se possível, criar uma nova franchise de ação.
Pelo que os trailers indicavam, o produtor Jerry Bruckheimer estava tentando isso, e um pouco mais, afinal, o contexto do jogo “Príncipe da Pérsia” trazia um aspecto épico que não poderia ser ignorado.

E é exatamente nesse fator que ele e o diretor Mike Newell investem no início do filme, não que seja recheado de batalhas entre exércitos intermináveis, mas é o modo como o combate é delineado, sustentado por uma intriga familiar que tende a conduzir a trama.
O ex-órfão Dastan, hoje um dos príncipes da Pérsia, passa a ser aquele que pode desmantelar uma conspiração para tomar o poder do reino.
Nada original, mas nada mal.
E assim passam vários minutos da metragem em que as lutas e perseguições, baseadas em grande parte no parkour, além dos efeitos especiais competentes vão mantendo o filme um divertimento suficiente para que o espectador acredite que está assistindo um dos prováveis êxitos provenientes dos games para a telona.
Ledo engano.


Esta premissa óbvia e simplória só poderia sustentar um longa-metragem caso o diretor responsável fosse capaz de tornar as novas sequências em espetáculos de ação dignos de compensar o roteiro sem nenhum aspecto realmente interessante.
Ao invés disso, o cineasta Newell perde o controle de sua obra em tentativas de soar sério, e em equívocos tentando ser engraçado.  Logo, o pouco que havia de razoável acaba indo por água a baixo quando até mesmo as lutas tornam-se repetitivas e sem graça, em um desperdício de tempo facilmente comparável ao pior longa-metragem proveniente da franquia “A Múmia”, ou seja: “O Escorpião Rei” (2002).
Enquanto isso, as atuações fracas e cheias de canastrice não ajudam, e mesmo o elogiado pela crítica em seus outros filmes, Jake Gylenhall, esquece de tudo que aprendeu a respeito de atuação para se adequar à trupe de coadjuvantes que compõem todo o elenco.
 

E quando chega a ficar claro que “Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo” não tem menor chance de ser melhor do que isso, o jeito é apenas suportar a infinidade de minutos que resta de filme, lamentando que nem os clássicos estejam imunes à maldição dos games no cinema.


Quanto vale: NEM meio ingresso.

Príncipe da Pérsia: As Areias do Tempo
(Prince Of Persia: The Sands Of Time)
Direção: Mike Newell
Duração: 116 minutos
Ano de produção: 2010
Gênero: Aventura


terça-feira, 7 de dezembro de 2010

GHOST IN THE SHELL 2: INNOCENCE (2004)


 

Enquanto o cinema estadunidense desenvolvia suas regras e normas de produção de superproduções que faturavam milhões nas bilheterias, o resto do mundo também definia seus rumos e estilos para o futuro da arte cinematográfica.

Distante do que Hollywood havia definido para ser o padrão que hoje vigora em 95% do que chega às salas de cinema no Brasil, cada país vinha utilizando uma variedade de elementos que viriam a concretizar a identidade autoral de seus filmes.
Pouco se lixando para convenções estipuladas para obter um blockbuster, o diretor japonês Mamoru Oshii já tinha em seu currículo o ótimo “Ghost In The Shell” (1995), e entregava em 2004 a sequência aguardadíssima desta adaptação de HQs.
E qualquer expectativa a respeito desta nova obra estava errada.


O megalomaníaco diretor estava obstinado em desenvolver todos os conceitos do primeiro longa-metragem a um extremo tão inimaginável que até mesmo resumir a história na sinopse seria algo impossível.
O futuro cyberpunk apresentado no roteiro chega a ser algo perturbador, afinal, representa o auge da obsessão humana por perfeição, o que leva à substituição do próprio corpo por peças e softwares, tornando qualquer um em computador pessoal que anda, trabalha e se relaciona com outros seres quase não-humanos.  
O que nos diferenciaria de máquinas (afinal até os cérebros utilizados são eletrônicos) seria algo chamado Ghost, o equivalente ao espírito, e esse ponto é presença fundamental nesta jornada que passeia pelos meandros da subconsciência.
Mas essa é apenas a ponta do iceberg.


Enquanto investigam uma insólita trama de assassinatos em série, os protagonistas, (os policiais Batou e Togusa) reviram a memória em um duelo para ver quem consegue mencionar mais citações de filósofos e pensadores, sempre em busca de respostas, e sempre complicando as coisas para o espectador.
E nesse ambiente em que até os humanos são seres fisicamente artificiais, tudo parece irreal, porém mantendo sua consistência ainda assim.
A fusão da trilha sonora magistral de Kenji Kawai, o balé visual quase inerte e absurdamente hiper-detalhado, além dos diálogos inspiradíssimos, resultam em um espetáculo hipnótico e transcendental. 


O visual ser perfeito é o mínimo que se espera de um filme de animação hoje em dia, mas até isso pode ser levado a outro patamar. Mamoru Oshii não se conforma em caprichar na técnica.
É preciso ir além, em uma demonstração de preciosismo que alia animação CG e convencional sem perder nunca a fluidez e ousadia na criação de cenários deslumbrantes e momentos de poesia alicerçada na parte estética e no contexto que se estabelece e se desconstrói a cada instante.
Cada segundo de metragem é investido para a consolidação de um mundo delirante, porém substancial.


Na elaborada trama sobra espaço inclusive para algumas cenas de ação que não decepcionarão os aficionados por tiroteios e explosões torácicas. Não que isso em algum ponto chegue a ser o foco da história.

Em determinado momento, quando nada mais parece ser realidade, talvez não seja mesmo.
Em “Ghost In The Shell 2” até mesmo à existência humana é dado o mesmo valor de um objeto qualquer, afinal, se o objetivo é a ilusão de uma falsa perfeição por meio da tecnologia, então porque não aceitar que desse modo nada nos distinguiria de peças de engrenagem, e que nosso propósito seria simplesmente agir mecanicamente até parar de funcionar um dia.
A perspectiva de Mamoru Oshii transforma os robôs nas vítimas subjugadas, semelhantes a escravos de nossa ambição, e questiona se uma sociedade tão degradada poderia sentir-se superior a qualquer outra forma de vida, mesmo aos seres artificiais criados pela humanidade para lhe servir.


 Dizer que “Ghost In The Shell 2: Innocence” é um novo “Blade Runner” peca não pelo exagero, mas sim por não reconhecer a força e genialidade da obra de arte surreal de Mamoru Oshii, que conseguiu não apenas uma das melhores adaptações de HQs de todos os tempos, mas também superar o seu original em uma demonstração de ousadia e estilo que transporta o espectador em uma das mais complexas jornadas pela mente humana já vistas no cinema.


Quanto vale: 2 ingressos.


Ghost In The Shell 2: Innocence
Direção: Mamoru Oshii
Duração: 100 minutos
Ano de produção: 2004
Gênero: Ficção científica / policial  


sexta-feira, 26 de novembro de 2010

MEMORIES (1995)

Pra quem realmente conhece cinema e desenhos animados, o nome Katsuhiro Otomo é lembrado especialmente devido à sua importância para uma crucial mudança no panorama mundial referente às formas de arte mencionadas acima.
Afinal, o seu clássico cyberpunk Akira (1988) foi um dos principais responsáveis pela visibilidade e aceitação que os animes japoneses adquiriram no Ocidente, nas últimas décadas.
Porém, esse seu outro projeto não foi tão alardeado assim.
Dividido em três episódios, cada um deles dirigido por um cineasta diferente, “Memories” é uma adaptação de algumas histórias Sci-Fi de Otomo, que produziu sua adaptação para o cinema e selecionou os responsáveis pela direção de cada parte do longa-metragem.
A sensação de unidade fica por conta das temáticas recorrentes da obra do consagrado autor de HQs e diretor.
Sendo assim, as clássicas situações de conflito entre homem X máquina estão presentes, além de um humor negro particular e a capacidade de inserir em tudo isso um viés pop que não dilui a ousadia da mensagem.
E se em Akira o roteiro nos conduzia em uma visão distópica de um futuro que rememorava os anos 60, em “Memories” somos transportados para a década de 80 na perspectiva de ficção-científica do autor.
E dessa vez, apesar de a proposta ser bastante diferente de seu trabalho mais famoso, o retrato não é menos visceral.


De início, Magnetic Rose, com a adaptação do roteiro feita por Satoshi Kon, e direção de Koji Morimoto, é o olhar pessimista a respeito do sonho de conquista do espaço almejado pelas potências antagônicas durante a Guerra Fria. Jamais os líderes americanos ou soviéticos sonhariam em ver seu investimento resultando em um bando de catadores de lixo espacial.
Transitando pelo gênero de terror, possui ainda assim uma construção narrativa de notória intensidade e foco no drama dos personagens que o mantém livre de comparação com as infames tentativas hollywoodianas de realizar algo que preste neste gênero.



A seguir, Stink Bomb, do diretor Tensai Okamura, é o ponto de equilíbrio entre tensão e humor no longa-metragem.
Mas o ar cômico não deixa de funcionar em uma demonstração de humor negro a princípio inusitada, em se tratando de um enredo que retoma o medo de um ataque americano devastador novamente em solo japonês. As caricaturas dos militares estadunidenses, e o tom de exagero na situação desencadeada são os pontos altos nesse conto de horror e ação que prepara o espectador para o último episódio.



Em Cannon Fodder, o desfecho do filme, dirigido pelo próprio Katsuhiro Otomo, as coisas deixam de lado a sugestão e partem para o discurso de crítica direta.
Referências existem aos montes em tela, porém quem as deixar passar ainda terá muito no que refletir diante do cotidiano da cidade cujos habitantes existem simplesmente em função da produção de material bélico visando munir os incontáveis canhões apontados para um inimigo que ninguém vê ou sabe quem é.
Trata-se da corrida armamentista em seu estado extremo e suas consequências, desde o quadro de miséria e alienação da população até à contínua lavagem cerebral pela qual passa a população para ser mantida incapaz de questionar os motivos do conflito.
Optando por uma arte menos convencional, e sendo contado em plano sequência, Cannon Fodder é o mais rico em possibilidades e o mais poderoso em sua abordagem.

As perspectivas dos três diretores a respeito de períodos históricos de grande influência na sétima arte tornaram possível ao filme esquivar-se dos lugares comuns ao tratar do tema, obtendo uma profundidade que rivaliza com produções em live-action sem ficar devendo em nada no que se refere ao caráter ácido esperado de um trabalho deste teor.
E apesar de não ter obtido tamanha repercussão se compararmos com seu filme de maior sucesso, é ainda assim notório que Otomo soube moldar um material coeso e possuidor de um inegável potencial Cult.


A singular obra do autor representa assim mais do que uma forma de revisitar os erros do passado, mas também, e principalmente, uma maneira de obter um alcance maior do conteúdo questionador de seu roteiro, que revive a memória coletiva do povo japonês acerca do saldo abominável da Segunda Guerra para o seu país, e atualiza a discussão para as próximas gerações, responsáveis por repetir tais fatos ou impedi-los de novamente acontecer.
Memories é uma obra que consegue ser atemporal em sua representação da realidade, e que não limita-se ao que o público assiste ao longo de sua metragem, afinal, ao fim da sessão haverá muito a discutir, e novos significados surgirão cada vez que reassistir o filme.


Quanto vale: um ingresso e meio.

Memories
(Memories)

Direção: Koji Morimoto, Tensai Okamura, Katsuhiro Otomo

Duração: 113 minutos

Ano de produção: 1995
Gênero: Drama / Ficção Científica / Terror / Ação

terça-feira, 23 de novembro de 2010

3º SHIN ANIME DREAMERS - A última Sessão de Cinema em 2010

E está definido o longa-metragem que encerrará a excelente seleção de filmes realizada no 3º Shin Anime Dreamers - S.A.D. no dia 24/11/10, quarta-feira, vulgo amanhã.
Pra quem vinha acompanhando o Blog, sabe que a programação contava com um filme que seria escolhido interativamente pelo público, e eis que a contagem de votos decretou o vencedor.


O longa-metragem de animação "Memories", do aclamado diretor e mangaká Katsuhiro Otomo, será exibido no encerramento do Ciclo, no auditório da CESMA, a partir das 19hs
Dividido em três contos, cada um dirigido por um cineasta diferente, permite três perspectivas diferentes a respeito da relação entre homem e tecnologia, com um leve toque de humor negro, e a visão pessimista de Otomo a respeito do tema.
O diretor Otomo ficou conhecido mundialmente pelo seu épico cyberpunk pós-apocalíptico "Akira", e em "Memories" muitas das características de sua filmografia estão novamente presentes.
Antes da sessão, haverão comentários de Marcel Ibaldo, integrante do Quadrinhos S.A. e Q Studius.


 Até.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

ZUMBILÂNDIA (2010)



Por alguma razão desconhecida os zumbis estão na moda. 
Quer dizer, eu até deduzo as razões pelas quais eles estão em alta no cinema, HQs, literatura, etc.
Em uma época de vampiros enfadonhos e assustadoramente sem graça, um pouco de atitude não faria mal, e nada melhor do que um holocausto zumbi pra recolocar as coisas nos eixos.
Dentre as criaturas terrorísticas, os zumbis sempre me pareceram os que propiciavam histórias mais interessantes, mesmo que na maioria das vezes os autores optassem por caricaturizar esse subgênero.
Recentemente, com a iniciativa de resgatar esses seres do limbo da cultura pop, a temática acabou obtendo contornos mais sérios, sendo isso exemplificado especialmente por “Extermínio” (28 Days Later, 2002) e “The Walking Dead” (tanto a HQ, quanto a serie de 2010). Um dos poucos exemplos recentes mencionáveis, o qual apresenta a história de um modo mais humorado foi em “Todo mundo quase morto” (Shaun Of The Dead, 2004).
A proposta deste Zumbilândia é particularmente próxima desse último exemplo.
O seu início é uma explosão de estilo e bom humor.

O protagonista Columbus descreve o seu curioso manual de conduta frente ao quadro de pós-apocalipse em que vão transcorrer os cerca de 90 minutos do filme.
A receita mesclando comédia, roteiro rápido e esperto, mais a fluidez das cenas sempre com a interação entre os diálogos e a videoclíptica edição de vídeo, tornam extremamente fácil acompanhar a história do nerd que faz o que se espera de alguém que tenta sobreviver em meio a um mundo de acéfalos canibais.
Divertido, é fato, mas nada original.

Porém, se não tenta inventar algo novo, o diretor Ruben Fleischer possui uma série de cartas na manga que visam equilibrar as coisas.
O tal personagem principal é retrato de sua época.
Um cara sem amigos, e que vive trancado em casa, o que não é distante da facilidade de se relacionar via web e da consequente escolha de evitar conhecer seres humanos de maneira presencial.

O seu contraponto é Tallahasse, interpretado com a competente canastrice que se exige pelo veterano Woody Harrelson. Enquanto Columbia é um adolescente “normal”, a excentricidade de Talahasse é reflexo do contexto. A infestação zumbi e sua destruição serviram de catalisador, e transformaram-no em alguém sem nada a perder, e não tendo nada a perder, ele decide avacalhar com o que for que estiver no caminho.
Essa forma quase juvenil de contar o enredo escolhida pelo diretor pode ter dois efeitos:

1 – o filme fica despretensioso demais, e esquecível pelo público, devido à banalização do tema.

2 – a plateia entende que essa releitura das histórias de zumbis foi o recurso escolhido pelo cineasta para relatar o processo de amadurecimento de seus protagonistas, que mesmo nessa situação limite parecem mais preocupados com a simplicidade das coisas presentes no cotidiano de qualquer um, mesmo que a raça humana ainda esteja à beira da extinção.

Esse aspecto foi na verdade o que me pareceu mais interessante.
Não necessariamente o longa-metragem precisaria estar ambientado em um território repleto de mortos-vivos. Poderia ser qualquer subúrbio, de qualquer época, e os resultados no que se refere ao desenvolvimento dos personagens poderiam ser praticamente os mesmos.

Ainda assim, por ser uma trama envolvendo zumbis, é uma pena que o desafio dos sobreviventes seja algo tão modesto. Não parece realmente complicado ficar vivo quando derrotar os zumbis é apresentado meramente que nem jogar um videogame no modo de dificuldade easy.
Mesmo assim, Zombieland consegue ser diversão certeira e descompromissada, com um ótimo timing de humor que há tempos não era destinado aos monstrengos trash que devoram cérebros.


E se alguém acha que realizar um filme de zumbis de simples entretenimento que valha a pena assistir é trabalho fácil, vale lembrar que isso é algo que o próprio George Romero, o mais importante diretor dessas produções, não consegue desde épocas que eu nem lembro.
Desse modo, ter conseguido isso é o que faz com que Zombieland, apesar de suas limitações, seja um filme de terror engraçado que não assusta ninguém, e ainda assim muito legal de assistir.

Quanto vale: um ingresso.

Zombieland
(Zombieland)
Diretor: Ruben Fleischer
Duração: 88 minutos
Ano de produção: 2009
Gênero: Ação/Comédia

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

KEEP DRAWING - The Rock Project


Ultimamente, tendo dedicação quase exclusiva às críticas de cinema, percebi que está mencionado no perfil ali na direita a palavra quadrinhista quase que só de enfeite.
Sendo assim, pra corrigir este potencial equívoco, vou publicar no blog de vez em quando alguma ilustra a respeito de uns projetos em que tenho trabalhado.
Desse modo, pra essa semana, fica um dos character designs pra uma HQ a qual se passa no universo rock'n roll.
O roteiro escrito por mim está sendo quadrinhizado pelo desenhista goianiense Walinton "Pulga" Lima.

Curtam a ilustra abaixo, que é um teste de personagem para a história.




E pra mais informações a respeito desse projeto, em breve mais ilustras aqui no blog, ou no BLOG do Walinton Pulga.

Até.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

TROPA DE ELITE 2 (2010)


“Tropa de Elite” mudou o panorama do cinema nacional.
De algum modo, o filme de José Padilha repercutiu não apenas devido à sua intrincada temática, mas também por causa de uma série de inesperados fatos que de certo modo tinham a ver com a problemática abordada no roteiro.
Eu particularmente não esperava que houvesse uma continuação do filme, mas foi do interesse do diretor retomar a trama do notório Capitão Nascimento para contar uma nova história.

A expectativa era tanta que obviamente seria quase impossível superá-la.
Supondo que se tratasse de uma franquia hollywoodiana de ação, este filme deveria ser uma versão de seu antecessor, ampliada e com mais recursos.
De certo modo, é isso mesmo.
Porém, em sua totalidade, é bem mais que isso.

Os personagens agora convivem com um quadro político-social diferente, em constante evolução e adaptação às manobras realizadas pelo governo e pela polícia para expurgar o tráfico, ao menos aos olhos da mídia.
O Tentente-coronel Nascimento a que somos apresentados a princípio não difere tanto do primeiro longa-metragem, mas sua transição marca um dos aspectos primordiais da trama.
A distância do filho, e a dificuldade de burlar a burocracia que limita suas ações são apenas a ponta do iceberg. O roteiro, apesar de fictício, inspira-se em eventos reais, e acerta em cheio em cheio ao retratar a evolução do crime organizado, e ao revelar nos bastidores do Congresso Nacional a metodologia que uma vasta gama de criminosos utiliza para lucrar ilegalmente como o consentimento democrático da população.
Para quem é fã de filmes de ação, preparem-se para se decepcionar, ou para assistir o melhor filme do gênero em 2010.
Dependendo do interesse do público, este filme pode ser qualquer um dos dois.

Afinal, o roteiro inteligente e ousado não teme e não perde a oportunidade de escancarar os assuntos mais polêmicos concernentes à nossa vergonhosa situação política. O personagem de Wagner Moura, muitas vezes torna-se mero observador em meio a tantas reviravoltas e ao frenético desenrolar da caricata ação dos vilões.
No entanto, quando eu menciono que se trata de algo caricato não é meu objetivo sugerir um defeito do filme. Muito pelo contrário.
O diretor Zé Padilha simplesmente captou a essência do quadro de funcionários eleitos pelo povo para encher as propagandas eleitorais com promessas vazias, e os próprios bolsos com o dinheiro que poderia evitar a morte de tanta gente nas filas dos hospitais, ou  garantir uma condição de vida digna para aqueles que sofrem diariamente com as consequências da desigualdade social.

Nada poderia ser mais atual do que a caracterização dos políticos no longa-metragem, que se por um lado são cômicos, perdem totalmente a graça quando lembramos que o campeão de votos na última eleição fez questão de utilizar seus conhecimentos no ofício da palhaçada em sua campanha, o que cativou os eleitores com sua proposta de não fazer porcaria nenhuma em troca de um salário de deputado.
Quando eu disse que “Tropa de Elite 2” não é apenas um filme de ação, com certeza eu me referia ao forte teor político e crítico de seu roteiro, e ao ritmo que o deixa com cara de thriller policial, mas também ao clima assustador que incorre da constatação de que por mais exageradas que sejam as ações violentas da quadrilha composta pela cooperação da polícia, da mídia e dos políticos, de forma alguma podem ser consideradas irreais diante do que vemos diariamente nos noticiários, e que parece não haver solução para o problema considerando aqueles que são responsáveis por decidir quem deve ir pra cadeia quando as provas estão postas na mesa.

A violência exacerbada é um reflexo disso, do mesmo modo que as atuações viscerais por parte do elenco. E se o roteiro não fosse tão bom, as atuações ainda assim o tornariam um dos melhores filmes de 2010.
É o tipo de intensidade que o cinema brasileiro adquiriu com o estabelecimento de um treinamento de atores rigorosíssimo, e que resulta na formação de elencos cada vez mais impressionantes. É impossível sair impassível ao final da sessão diante de tamanha explosão dramática.

E enquanto isso, o protagonista Nascimento combate suas limitações evidenciadas pelo poder de seus novos inimigos. De repente ele percebe que as coisas não podem ser resolvidas simplesmente através de um tiroteio. A verdade que ele aprende mostra que o primeiro filme era apenas uma prévia ambientando o espectador para o que estaria por vir nesse novo lançamento.
É ele o herói de “Tropa de Elite 2”, e é o seu aprendizado que permite vislumbrar alguma chance de vitória contra a milícia criminosa.
O equilíbrio entre a estratégia e a truculência estabelece um rumo que pode ou não apontar uma solução a longo prazo para esse quadro sombrio.


Somando todas as qualidades do filme, seu maior defeito é definitivamente não ter sido lançado em setembro. A discussão que propicia teria feito diferença no primeiro turno das eleições.
E além de ser o melhor candidato brasileiro para o Oscar, seria um choque para a  esmagadora maioria dos cineastas estadunidenses notar que um diretor brasileiro os desafiou em seu próprio terreno, filmando uma obra de ação que dificilmente algum deles conseguiria, ou teria coragem de filmar.

Quanto vale:



Tropa de Elite 2
Direção: José Padilha
Duração: 116 minutos
Ano de produção: 2010
Gênero: Ação