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quarta-feira, 10 de agosto de 2011

ROCKETEER (1991)


Não tinha jeito.
Tentativas repetiam erros comuns, e a baixa qualidade dos filmes de HQs permanecia um tabu a ser quebrado.
Restava apenas a esperança de que alguma das poucas exceções pudesse estar novamente a ponto de surgir.
Nesses tempos conturbados, cinequadrinhisticamente falando, as escolhas com maior potencial para uma aceitação pelas platéias eram obviamente as que parecessem menos espalhafatosas, e assim menos sujeitas à generalização no que frequentemente era chamado “filme de revistinhas”.
Sendo assim, optar pela obra de Dave Stevens parecia interessante, afinal, era uma espécie de meio termo entre o universo real e a pirotecnia super-heroística.
Ainda assim, essa época não era de certezas.

Ao diretor Joe Johnston, a missão de criar um clássico do cinema de HQs, ou seja, simplesmente realizar um filme adequado, o que já seria o suficiente para torná-lo clássico.
A própria premissa ajudava muito.
“Jovem piloto que acidentalmente encontra um equipamento que permite ao seu possuidor voar.”
As possibilidades ilimitadas hoje em dia estariam sujeitas a meramente sequências vertiginosas em 3D, com clichês do início ao fim, e algum ator sujeito a comparações com Justin Bieber.
No longínquo 1991 essas tendências ainda eram inexistentes, e os efeitos especiais não eram ainda sinônimo de possível salvação nas bilheterias, por isso, ao roteiro era adicionada uma dose maior de responsabilidade, do mesmo modo que a capacidade do diretor em ter ideias e estratégias para convencer o público que, o fato de ser oriundo dos quadrinhos era um “defeito” menor que não ofenderia o gosto apurado de quem evitava as HQs por serem estritamente historinhas para criancinhas.

Complicado? Certamente.
Mas Joe Johnston é um cara esperto.
Pode ser difícil imaginar isso pra quem tem na lembrança um de seus recentes trabalhos, o fiasquento “O Lobisomem” (2010).
Ainda assim, mesmo nesse fracasso monumental pode-se perceber algumas qualidades do trabalho do cineasta, mesmo que diluídas em uma avalanche de incompetência que assolou o filme do monstro da Universal.
Enfim, em Rocketeer ele sabia o que fazer, e estava realmente ciente do que teria que fazer.
A receita utilizada por ele empregava os efeitos especiais e o clima de Sessão da Tarde com inteligência, de modo a evitar errar por excessos ou limitar o público potencial aos aficcionados por HQs, o que teria sido um desperdício.

Afinal, era por demais interessante para ficar relegado a uma parcela dos espectadores.
Não era apenas o retrô. Era mais do que isso, uma espécie de fusão rica em alternativas e possibilidades: o retrô futurista.
A tal mochila com foguete era um olhar acerca de possibilidades além do que o contexto em que se passa a história poderia sonhar.
Não à toa que assisti-lo é a preparação ideal para conferir o último trabalho do diretor: “Capitão América: O Primeiro Vingador” (2011).
Substitua o jato propulsor pelo soro do supersoldado, e o resto poderia funcionar perfeitamente exatamente do jeito que está nessa produção.

O piloto Cliff Secord (Billy Campbell), apesar de possuir bem mais desenvoltura do que o idealista tímido Steve Rogers, possui o mesmo instinto heróico singular, e não é um herói por algum drama ou tragédia que tenha marcado sua vida. Ele salva as pessoas ao seu redor simplesmente por que é natural para ele que isso seja feito.
Vítima do acaso, ele terá a responsabilidade de fazer bom uso da revolucionária tecnologia, enquanto salva a mocinha e impede que a ameaça nazista consiga pôr seus planos em prática, bem ao estilo Capitão América.

Admito que depois de ter assistido “O Lobisomem” (2010) minhas esperanças quanto ao filme do herói da Marvel Comics fantasiado de bandeira norte-americana deixaram de existir, porém, bastou reassistir Rocketeer para perceber que Johnston teria apenas que repetir o que ele já havia realizado para que o resultado fosse algo positivo.
E apesar de o roteiro ser bem amarrado, o entretenimento ser favorecido pelo ritmo dinâmico, e as sequências de ação serem bem filmadas, é a aura quase juvenil que torna a sessão verdadeiramente empolgante.

Despretensiosamente, o filme passa pelos clichês sem grandes problemas, e a presença dessas obviedades no enredo não chega a prejudicá-lo a ponto de ficar inassistível. O efeito da previsibilidade é amenizado exatamente pela capacidade do diretor em deixar claro que estamos vendo um longa-metragem destinado à pura diversão, de maneira que sempre que surjam novos elementos no andamento da trama isto seja ainda mais eficaz.
Somar isso ao elenco afiado que ainda contava com o vilão interpretado pelo ex-007 Timothy Dalton, o Howard Hughes na atuação de Terry O'Quinn (do seriado Lost), e pela sempre merecedora de elogios Jennifer Connely, é chegar a um exemplar de atípico apelo pop sem deixar sua integridade de lado em prol disso.


 Não sem motivo, Rocketeer é um daqueles memoráveis filmes que poderiam ser vistos inúmeras vezes quando passavam na televisão, mantendo a fidelidade ao material de que se originou em harmonia com o significado da palavra “adaptação”.
E também não é por acaso que influenciou autores da importância do criador dos cults “Akira” (1988) e Memories (1995), Katsuhiro Otomo, que fez sua própria versão da história do jovem com a mochila-foguete em “Steamboy” (2004).
Na lista dos meus filmes de HQs favoritos, o filme de Johnston é ainda lembrado por seu papel na lenta revolução que deu origem à atual obsessão de Hollywood por buscar enredos nas páginas das revistas em quadrinhos.
E assim, assistir seu mais recente trabalho foi mais do que constatar o quanto as coisas mudaram desde que Cliff Secord desprezou a lei da gravidade pela primeira vez sem a ajuda de um avião, ou acompanhar a evolução da Marvel nos cinemas.
Afinal, para Joe Johnston era hora de voltar às origens, e o cinema de HQs precisava disso.


Quanto vale: meio ingresso com absoluto louvor.

Rocketeer
(The Rocketeer)
Direção: Joe Johnston
Duração: 108 minutos
Ano de produção: 1991
Gênero: Aventura / Ação


3 comentários:

Anônimo disse...

Eu lembro que na época em que esse filme foi lançado, a crítica avacalhou com. Eu sempre considerei isso uma grande injustiça.

Anônimo disse...

Eu lembro que na época em que esse filme foi lançado, a crítica avacalhou com ele. Eu sempre considerei isso uma grande injustiça.

Marcel Ibaldo disse...

A estética retrô é uma das coisas mais legais nesse filme.
Mas foi provavelmente o lance de patriotismo que foi questionado por muitos.
De qualquer modo, quem quiser pode tirar suas conclusões no Cineclube Quadrinhos S.A., que contará com o filme em sua programação em 2011.

Valeu pelos comentários.