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quinta-feira, 19 de julho de 2012

HOMEM-ARANHA 3 (2007)



Era uma ocasião sem precedentes.
O encerramento da primeira trilogia Homem-Aranha vinha sendo chamado de o maior filme de heróis de todos os tempos.
Isso porque após dois competentes primeiros filmes, e uma bilheteria que fez as franquias “X-Men”, e “Blade“ caírem no esquecimento durante a véspera do terceiro longa-metragem do aracnídeo, Homem-Aranha 3 chegaria sem alterações em seu elenco principal, ou de diretor. Ou seja: ao que tudo indicava, a qualidade dos anteriores retornaria.
E não apenas por isso, mas também pelo marketing associado ao lançamento, que reforçava a certeza de sucesso comercial.

Elenco e diretor de volta, além de novas adições dentre os personagens vindos das páginas da Marvel Comics, e que pareciam estar lá muito mais para agradar o público do que por uma questão de decisão do cineasta responsável.
E pra falar a verdade, Sam Raimi não estava mesmo interessado em muito do que estaria presente.
Seu roteiro original teria na função de principal vilão o Homem-Areia, algo que foi rechaçado pelo estúdio que fez questão de um novo direcionamento das atenções do protagonista.
Ainda assim, o Flint Marko (interpretado por Thomas Haden-Church), o qual irá se transformar no ser arenoso, reflete muito bem a atenção que Raimi havia lhe dedicado afim de que fosse verdadeiramente digno de ser o principal adversário do herói nesta empreitada.
Afinal, em Homem-Aranha as motivações sempre são peça primordial na trama.
Enquanto nos quadrinhos muitas vezes heróis são heróis porque ganharam poderes, e só, e vilões idem, o Homem-Areia seguirá uma estruturação que lembra o cuidado que Raimi teve com o próprio Aranha, salvas as devidas proporções.

Em Homem-Aranha 3, o outrora capanguesco Flint Marko tem razões para suas atitudes, não tornando-se o vilão por comodismo ou a praticidade de não perder tempo na fila do banco para sacar seu dinheiro. Ele não rouba pela riqueza em si, e sim por uma questão familiar que o filme vai tentar explicar.
E eu digo “tentar” porque se torna um exercício a mais do diretor conseguir lidar com a imposição do estúdio, afinal, além do Homem-Areia, e do Harry Osborn/ Duende Verde (James Franco) que ele preparou com atenção redobrada nos outros filmes, Raimi é obrigado a adicionar um personagem dos quadrinhos o qual o próprio diretor não aprecia, e com isso as coisas rumam para fora dos trilhos.
Mas vamos por etapas.

Peter Parker (Tobey Maguire) vive um bom momento desta vez.
Especialmente no que se refere ao relacionamento com Mary Jane (Kirsten Dunst), afinal, o Homem-Aranha não tem representado empecilho desde que Peter parece ter encontrado o equilíbrio entre ser o vigilante mascarado e sua vida pessoal.
Enquanto isso, seu outrora amigo Harry enfim irá servir ao propósito para o qual veio sendo desenvolvido, tendo de ser o pior de todos os vilões que o herói já enfrentou.
E isso não tem nada a ver com poder.

Na franquia Homem-Aranha, uma característica essencial nos vilões é uma proximidade com o próprio herói, e isso esteve presente no Duende Verde (Homem-Aranha, 2002), no Doutor Octopus (Homem-Aranha 2, 2004), e não seria diferente em 2007.
Porém, Harry Osborn foi o que teve o desenvolvimento mais detalhado, e na trama ele não é menos que um irmão para Peter.

Assim, do mesmo modo que Sam Raimi trabalha a empatia da plateia com o nerd do Queens que combate o crime, as pessoas ao seu redor, enquanto parte de uma família com o próprio, devem também ter significado para o espectador.
Na busca por sua vingança, aliás, este novo Duende Verde vai ser responsável por uma das melhores sequências de ação do filme, em um combate que é um excelente cartão de visitas do que o longa-metragem promete, sempre com a marca registrada do cineasta, além dos efeitos especiais que ele se acostumou a empregar desde que se tornou diretor com crédito em Hollywood.
E o resultado dessa perseguição do novo Duende Verde ao Spider-Man terá consequências fundamentais ao longo do filme.

Porém, ainda que o Harry vilanesco saia de cena por um tempo, o Homem-Areia vai ser problema o suficiente pro heroísmo de Peter resolver, com mais algumas sensacionais sequências de ação nos embates entre os dois, ainda que nenhuma delas se compare à extraordinária representação do acidente que muda a vida de Flint Marko.
O oceano de areia é um primor visual e demonstração do envolvimento do cineasta com a exigência de fazer crível o mais exagerado super-poder a surgir na franquia.

Não que isso adiante muito, afinal, quando as coincidências começam a acontecer, antes mesmo da referida cena, credibilidade não é exatamente o que o filme passa para o público.
Fica evidente que o roteiro teve que se adaptar ao surgimento de um novo personagem, aquele que eu mencionei que o cineasta nem aprecia dos quadrinhos, e seu nome é Venom.
Nas HQs o simbionte alienígena é vinculado ao segmento “megassagas da Marvel envolvendo um monte personagens”, algo que em 2007 ainda nem era sonhado que pudesse ocorrer no cinema, pois “Os Vingadores” (2012) era algo inimaginável, e “Homem de Ferro”, o primeiro acerto do Marvel Studios só iria estrear no ano seguinte.
Então, de que maneira o simbionte iria surgir?
Não interessa. Inventem que ele cai por ali, onde o Peter está”.

Nesse embalo, o Eddie Brock (Topher Grace) responsável por “vestir” o simbionte assim que Peter consegue se desvencilhar dele, terá papel de seu concorrente no Clarim Diário, e tem seu interesse romântico atendendo pelo nome Gwen Stacy (Bryce Dallas Howard), que irá criar uma fixação pelo Homem-Aranha após este salvá-la (deixando para trás o perigo para os figurantes escaparem por conta própria, vale mencionar), e a moça então funciona para fazer ciúmes a Mary Jane, que além de cantar mal e por isso ser dispensada de seu musical, tem que aguentar seu namorado Peter mergulhado em excesso de confiança, que logo se mistura com raiva ao descobrir com sua tia May (Rosemary Harris) que o Capitão de polícia Stacy (James Cromwell), pai de Gwen, tem provas de que o responsável pelo assassinato de Ben Parker (Cliff Robertson) lá no primeiro filme, era na verdade Flint Marko.
Então. Parece enrolado?

Isso se deve ao fato de que realmente é uma tresloucada sitcom o que torna-se grande parte do filme, para assim dar conta de apresentar tanta gente no elenco, tendo cada um deles um considerável tempo em cena, afinal, a essa altura todos são de alguma maneira importantes para o enredo.
É muito fácil durante o assistimento do filme se perder em sub-tramas que tentam beirando a exaustão (do espectador) ligar todos os novos fatos e dramas particulares de cada personagem.
E isso na maioria das vezes é feito por meio de clichês e coincidências.
Ainda que, se no Prometheus de Ridley Scott (só pra mencionar um exemplo recente) as coincidências sejam o ar que o filme respira por comodismo, no Homem-Aranha 3 é perceptível que o diretor Sam Raimi simplesmente não tinha o poder de mando e desmando que um Riddley Scott tem frente ao estúdio, e por isso foi pondo em prática a arte do remendo para tentar salvar sua obra.
Muito fácil lembrar de outra adaptação de HQs envolta em expectativa e que acabou sucumbindo às insistentes bobagens de estúdio interessado em dinheiro mesmo que sacrificando o futuro da franquia, pois o "X-Men Origens: Wolverine" teria em 2009 aspectos similares durante sua produção, os quais acabaram prejudicando o trabalho do diretor Gavin Hood, e o resto todo mundo sabe.


Em Spider-man 3, é graças ao empenho do diretor que ao menos existem ainda bons momentos com alguma dramaticidade, dignos de nota, dos quais ressalto o plano de Harry para vingar-se de Peter assim que o herdeiro do clã Osborn recupera a memória.

Fora isso, lamentavelmente destacam-se algumas caracterizações ruins (o uniforme do Duende Verde, ou a deplorável versão “dark” de Peter), ou exageradas demais (a conversão do Homem-Areia em ser hediondamente fora dos padrões do universo do Aranha, mesmo que sempre com impecáveis efeitos CG), além, é claro, do Venom que não diz a que veio.
O principal responsável pela perda de foco no roteiro, aparece no filme simplesmente pra soar um capanga a mais, em um filme que poderia ter sido sim um épico do nerdismo.
E no que se refere à simbiose com Peter, ele mais serve para demarcar as cenas que denotam a crescente busca do personagem por vingança.

Há acertos, é claro, e a maioria deles se deve a Sam Raimi.
O diretor de Evil Dead sabia realmente em que estava trabalhando quando construiu os laços de proximidade entre os personagens ao longo dos filmes, e no que lhe é possível, desata os nós no terceiro longa-metragem, esclarecendo que isso tudo foi a jornada de Peter Parker, e não do Homem-Aranha.
Afinal, é Peter quem vê seus relacionamentos arruinados, e as pessoas com as quais se importa sofrendo as consequências por suas atitudes.
E se ele é o responsável, e faz o possível para remediar seus erros, nada mais justo do que ele estar disposto ao perdão.

O Homem-Aranha segue seu caminho combatendo bandidos, mas seu alter-ego tem que lidar com a perda, e certamente com a culpa, algo que ele carrega desde o primeiro filme, e que de certo modo o cineasta busca exorcizar nesse desfecho de sua participação na cinessérie.
Por isso, a tragedia do protagonista resulta em escolhas, que até pela responsabilidade que envolve sua decisão de ser herói, acabam indo de encontro ao que o típico blockbuster de ação faz o espectador imaginar que encontrará.
Ao fim, de maneira mais poética do que os executivos da Sony iriam insistir que fosse feito, Raimi devolve um pouco de dignidade à produção, que ainda assim acabou destinada ao limbo das produções a servirem de exemplo de decepção do público.
Mas ainda assim, a trilogia Homem-Aranha deixou sua marca, e o tanto de ideias e drama que o diretor teimou em adicionar em meio às vertiginosas batalhas, e ao oceano de personagens desprovidos de propósito nesse último capítulo serviriam para que fossem minimizados os efeitos que os erros recorrentes de Hollywood trouxeram para Homem-Aranha 3, que poderia ter sido melhor, mas também poderia ter sido bem pior.
As lições que Peter Parker, e Sam Raimi aprenderam com a trilogia ensinaram muito aos que ousariam trilhar pelo caminho do cinema de HQs.
Marvel Studios e Christopher Nolan que o digam.


Quanto vale: Meio ingresso quando muito.
Homem-Aranha 3
(Spider-man 3)
Direção: Sam Raimi
Duração: 139 minutos
Ano de produção: 2007
Gênero: Aventura/Ação


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